A ambivalência emocional diz respeito à existência simultânea de sentimentos contrários e é um fenômeno essencial da nossa vida psíquica. Na maternidade - esta função tão complexa -, um dos grandes desafios que se tem é justamente lidar com esse fenômeno, que se manifesta de modo especialmente intenso.

Ser mãe ocupa quase (muitos diriam todo!) todo o tempo disponível. Não há pausas e por vezes parece que nem todo o tempo do mundo é suficiente. O filho quer sempre mais. Ele se esparrama ocupando tempos e espaços de forma às vezes imperceptível, até que não sobre quase nada que não seja ele.

É nesse ponto que soa um alerta, um alerta de que é preciso conter essa espécie de "esparramamento", que parece sem limites, para que não haja um sufocamento. Busca-se encontrar pausas, pequenos espaços de individualidade, momentos em que não se exerça a função materna e em que seja possível realizar outros papéis.

Isso pode acontecer das mais diversas formas, um encontro com amigos, uma saída para quase qualquer lugar sem os filhos. Por exemplo, uma ida ao supermercado pode ser um breve um momento de respiro, em que a mãe pode voltar a ser novamente uma pessoa só, sem outro pendurado no peito ou no colo. Às vezes, a pausa pode ser o momento do sono ou da soneca, em que se dispõe de minutos ou horas para se desocupar da criança.

Ressalto o verbo "desocupar", porque, parece-me, trata-se disso. A maternidade é uma ocupação de 24 horas por dia, 7 vezes por semana. Não é um trabalho qualquer. Essa ocupação pode ser física, como amamentar, trocar fraldas, dar banho, brincar, e psíquica, desde aquela que se dá inconscientemente, sem que se perceba que ela acontece, até aquela das preocupações, ou melhor, das pré-ocupações, dos lembretes e listas de atividades que envolvem a criança. Aí está incluído marcar consulta com pediatra, planejar a data da próxima vacina, assim como pensar sobre questões mais complexas como reflexões sobre a educação da criança.

Eis que, quando você pode se desocupar de seu filho, quando você pode usufruir de um descanso, de um tempo para outras ocupações (ou não. Pode ser um tempo para fazer nada também!), você se flagra com saudade da cria. Sua filha dorme e você se pega com o celular olhando fotos e vídeos dela. Como pode?! Olha aí a ambivalência todinha fazendo festa! Você, exausta, doida por um tempo seu, sentindo-se tão pouco dona do seu próprio tempo, se pega, no escasso tempo livre, pensando e lembrando dos filhos.

Você deseja estar novamente junto do seu filho e também está quase desesperada por um tempo seu. E, aqui, vejam, escolho usar a conjunção aditiva "e" e não a adversativa "mas", porque as duas coisas se adicionam, ainda que não possam efetivamente acontecer ao mesmo tempo.

Lidar com sentimentos tão ambíguos, tão misturados, pode ser muito trabalhoso, porque quanto mais amamos, mais intensa é a ambivalência. Pode-se ir de um extremo ao outro em muito pouco tempo, do auge do cansaço e impaciência, quando se quer entrar numa nave e partir para um planeta distante, ao amor louco e desvairado, quando se quer abraçar e beijar infinitamente.

A maternidade, desde a gravidez, é um campo de intensidades, campo do muito, do desmedido. Muito amor, muito enjoo, muita ansiedade, muita emoção, muito incômodo, muito hormônio, muita felicidade, muito medo, muita potência, muita mudança, muita beleza, muita dúvida, muito cansaço. Nada aqui é pouco. Quer dizer, talvez o tempo seja...