Numa aula de teatro, o professor pede a um dos alunos que conte como havia sido seu final de semana. No mesmo instante, o aluno desvia o olhar, olha pra cima, para além de quem ali estava e começa a narrar. O que interessava, contudo, não era o relato do final de semana em si, e sim esse movimento espontâneo e involuntário que fazemos com o olhar para resgatar algo em nossa memória, para pensar ou inventar algo. O objetivo era observar detalhadamente esse movimento quase universal, de modo a ser o mais fiel possível a ele, em cena.

Às vezes somos mesmo convocados a ir a outros lugares permanecendo no mesmo lugar. Como quando lemos um livro e, fisgados por uma palavra ou frase, o abaixamos e olhamos para cima ou deixamos nosso olhar "perdido". Perdido mas fixado num ponto. Quase não piscamos. Trata-se de um olhar que olha e não vê. Não vê aquele ponto físico, material; vê algum lugar longínquo, para além da concretude. Dá-se o curioso fenômeno de estar e não estar ali.

Da minha janela, vejo um pedaço de horizonte que me lança nessa experiência. Entre os prédios que se colocam na minha visão, resta, na direção nordeste, uma parte da paisagem preservada, sem qualquer construção. Vejo, bem distante, a linha do horizonte, delimitando céu e terra. De tempos em tempos, enquanto estudo ou trabalho, levanto o olhar e, como um ímã, fixo-me nesse pedaço.

O que fica lá? A quantos quilômetros estou daquilo que avisto? O que esse horizonte guarda? Alguém mora lá? Será que, com a ajuda do Google Maps, haveria algum modo de responder a essas perguntas? Será que essas perguntas fazem sentido?

Talvez eu pudesse pegar um carro e chegar até aquele ponto efetiva e concretamente. Na cena, a câmera de um drone se afasta e mostra a distância entre meu ponto de partida e meu ponto de chegada. Seria interessante de ver.

No entanto, a viagem que mais me intriga não é percorrível por meio de transporte. O ponto a que chego quando olho para o horizonte não é passível de ser mapeado, não tem latitude nem longitude. Google Maps nem ferramenta nenhuma são capazes de encontrá-lo. O ponto está dentro de mim, longe dentro de mim. Nessa lonjura interna, alcanço um espaço subjetivo, amplo e fértil, que ecoa a seguinte frase: Há horizonte.