Tenho ouvido repetidas vezes o novo álbum (comumente eu chamaria de CD mesmo) de Jorge Drexler e uma música em particular me fisgou nos últimos dias. Justamente a música que dá nome a ele, Tinta y tiempo. Linda, cuja letra é uma maravilha e me fez pensar tantas coisas. Transcrevo sua tradução abaixo:

Tinta y Tiempo
Lo que dejo por escrito
No está tallado en granito
Yo apenas suelto en el viento
Presentimientos
Pido lo que necesito

Tinta y tiempo
Tinta y tiempo
Tinta y tiempo
Tinta y tiempo

Pero me cuesta esperar
Y cuando toca decantar
Lentamente lo que siento
Yo me impaciento
Luego lo vuelvo a intentar

Tinta y tiempo
Tinta y tiempo
Tinta y tiempo
Tinta y tiempo

Nunca sé
Ni por qué
Ni cuándo
Esa voz
Yo no la
Comando

Y al final, siempre ando a tientas
Sin brújula en la tormenta
Pero tras el desaliento
Cada cuento
Si ha de pintarse, se pinta

Tiempo y tinta
Tiempo y tinta
Tiempo y tinta
Tiempo y tinta

Puede que
Nunca te
Calibre
Corazón
Siempre irás
Por libre

Nunca sé
Ni por qué
Ni cuándo
Esa voz
Yo no la
Comando

Tinta y tiempo
Tinta y tiempo
Tinta y tiempo
Tinta y tiempo

(...)
(Tinta y tiempo)

Transcrevendo a letra agora, relendo-a, parece quase desnecessário comentá-la, pois ela fala por si mesma. Mas como não falar dela - mesmo que brevemente -, se o tempo é tema recorrente por aqui e continua retornando; se a tinta é escrita e outro tema que me fascina e segue comparecendo?

A escrita, essa voz que não se comanda. Isso que quer se dizer, quer se falar, quer se nomear, isso que nos impacienta, incomoda. A escrita que todo tempo testa os limites da palavra, os limites da linguagem. É o escritor que sabe rompê-los, que sabe torcer, esticar, renovar, embolar, amassar, desenovelar palavras para fazê-las dizerem isso que se decanta dentro de si. Tatear as palavras, tantas vezes no escuro, para dizer o indizível, expeli-lo, dar-lhe lugar.

Penso no escritor que se espanta quando uma personagem criada por ele mesmo toma um rumo que ele não queria ou não havia imaginado, quase como o leitor que torce por um destino para uma personagem. Esses relatos sempre me intrigaram, pois parecem falar justamente dessa voz de que Drexler fala, uma voz que não se comanda, uma voz que traça seu próprio destino às vezes à revelia do escritor.

É preciso tinta e tempo, tempo e tinta. Tempo para decantar, elaborar, essa voz sobre a qual não se tem controle, mas que insiste, impõe-se. Inconsciente. Tempo para colocar em tinta, tinta para pintar o tempo.