Ultimamente, o tempo tem retornado muito como questão para mim. Não à toa, tem aparecido bastante por aqui. Nossa relação com o tempo, o que fazemos dele, como pará-lo, como fica o tempo na maternidade, etc. Parece que, ainda que pensando em diferentes questões, chego ao tempo. Tenho sentido que, no fim das contas, estamos sempre falando de tempo, do tempo.

Em sua última coluna, Julián Fuks pergunta-se como escrever sem solidão. Nesse texto tão bonito (como todos os outros dele), o escritor lembra dessa imagem do escritor solitário, que se coloca em um local distante para que possa escrever. E a solidão é mesmo essa coisa que se tornou tão difícil de alcançar, a solidão não como abandono, como Júlian mesmo diz, mas aquela da intimidade consigo mesmo, do silêncio, do retiro.

Quando escrevo agora, flagro-me confundindo silêncio e solidão, sentindo-os quase como sinônimos. E esse par, que agora parece-me indissolúvel, junta-se ao tempo, esse que vem me acompanhando e se relançando como pergunta, como interrogação. E logo chega uma, que parece boba: afinal, o que é o tempo?

Essa coisa tão abstrata, impalpável, intangível, para a qual criamos marcos, divisões, que ajudem a nos localizar. Tempos atrás, o tempo era marcado somente pela natureza, pela posição do sol; depois, o sino da Igreja vem dividi-lo. Chegamos aos segundos, minutos, horas, dias, semanas, meses, anos, décadas... O tempo vive em relógios - antes, ampulhetas -, cronômetros, despertadores, presos ao pulso, sobre a mesa de cabeceira, colados à parede, mas também tiquetaqueando dentro de nós mesmos.

Por vezes, o tempo ganha corporeidade, pode-se senti-lo atrás das costas, pressionando, apressando. Outras vezes, o tempo para, suspenso no ar, pausando a vida. Tantas vezes parece pouco, insuficiente, diminuto, mas também pode entediar, parecendo dilatado e até desnecessário. O tempo está em todo lugar e em lugar nenhum.

Lembro-me agora de um trava-língua da infância, pura sabedoria popular:

O tempo perguntou pro tempo quanto tempo o tempo tem, o tempo falou pro tempo que o tempo tem tanto tempo quanto tempo o tempo tem.

Quanto tempo o tempo tem? Quanto tempo temos? Será que o tempo é o que fazemos dele? Para sentir o tempo, talvez precisemos mesmo de silêncio e solidão. Ouvir o próprio vazio, sentir o próprio tempo, estar conosco e mais ninguém, fugir do barulho ou, silenciar para justamente ser capaz de escutá-lo. Aí, quem sabe, escrever...

(...) O que usaremos pra isso
Fica guardado em sigilo
Tempo, tempo, tempo, tempo
Apenas contigo e migo
Tempo, tempo, tempo, tempo

E quando eu tiver saído
Para fora do teu círculo
Tempo, tempo, tempo, tempo
Não serei nem terás sido
Tempo, tempo, tempo, tempo (...)
(Caetano Veloso)